Vinte anos depois, professor guaxupeano que errou pergunta do milhão no SBT quer voltar à TV
“Quantas letras contém a escrita da bandeira nacional brasileira?” foi a pergunta do milhão, gravado em dezembro de 2001 e exibido em 27 de fevereiro de 2002. Jair contou mentalmente e respondeu sem pestanejar: 16 letras. “Ordem e Progresso”, entretanto, tem 15 letras. O professor aposentado de língua portuguesa perdeu tudo e saiu do programa com míseras três notas de R$ 100, quantia paga a todos os competidores.
A coluna encontrou Jair Hermínio da Silva e o entrevistou por telefone um dia antes do aniversário de seu dia de glória (e queda) na TV. Prestes a completar 78 anos no dia 13, ele lecionou durante mais de 50 anos e assinou uma coluna no Jornal da Região. Conhecido na região, ganhou fama nacional por sua inteligência e capacidade de acertar algumas das questões mais difíceis do Show do Milhão, como o significado da palavra “onfalite” (inflamação no umbigo). “Acertei coisas que nem professores de História sabiam. Conheço um pouco de grego, árabe. Isso me ajudou muito em certas questões. Achei super fácil”, recorda.
“Silvio Santos que botou esse apelido de ‘Homem Enciclopédia’. Ele estava louco para dar o prêmio porque falou que o povo pensava até que era marmelada, porque ninguém ganhava. Falava: ‘Você vai ganhar, porque você merece!’. Ele me elogiou demais, mas foi meio exagerado (risos). Não tenho frustração nenhuma, adorei participar. A última pergunta nem tinha conhecimento específico, mas só tinham 20 segundos e passam mil e uma coisas na cabeça da gente. Não é que perdi porque não sabia. Acho que o problema era que a pergunta era muito fácil”, avalia.
Apesar do nervosismo, ele não se desesperou com o milhão perdido, diferentemente de sua amiga, Maria José de Camargo, que comprou a Revista do SBT para inscrever o professor e dividiria o prêmio com ele. “Vou te matar, Jair! Perdemos tudo!”, disse ela, puxando os cabelos no ar. Ela, que foi diretora da escola onde Jair lecionava, morreu há aproximadamente cinco meses.
Fama e volta à TV
O Brasil se sensibilizou com a derrota de Jair, que estampou capas de jornais e revistas e participou de programas de TV. No Superpop, ganhou dois carros ao acertar quantas letras havia no lema da nota de um dólar (“In god we trust”; em português: “Nós confiamos em Deus”). “A fama não acabou até hoje. Todo dia tem alguém que comenta! É incrível”, conta ele.
Embora não tenha conseguido ficar milionário, considera-se rico de saúde (hérnia de disco é sua única queixa). Vacinado com três doses, não contraiu covid-19 e espera o fim da pandemia para retomar seu hobby favorito: viajar.
Enquanto ainda não pode viajar, Jair se entretém com outro passatempo: assistir a game shows na TV. Ele continuou acompanhando o Show do Milhão após sua derrota e viu o bancário Sidney Moraes faturar R$ 1 milhão, em outubro de 2003. Entretanto, o professor identificou um erro na questão sobre o nascimento do ex-presidente Lula.
“A pergunta para o homem que ganhou foi mal formulada. Na verdade, ele errou a resposta, sobre quando Lula nasceu e foi registrado. Ele nasceu em uma data (27 de outubro) e registrado em outra data (6 de outubro). Ficou trocado ali, mas ficou como certo e ele ganhou o programa”, aponta.
Jair deseja voltar a participar de um programa de perguntas e respostas. “Eu assisto bastante ao Luciano Huck, aquele The Wall, semana passada foi o dia mais fácil de todos, não errei uma pergunta! Estava tudo muito fácil! Eu não fiz inscrição, mas tenho vontade sim [de participar]. Mas fazem muitas perguntas sobre a Globo, quem fez tal papel na novela, isso é muito chato. Façam perguntas inteligentes, de conhecimento geral, coisas interessantes! Por exemplo, de história, geografia, língua”, sugere.
Inspirado na resposta errada, a coluna perguntou ao professor o que mais falta ao Brasil: ordem ou progresso? “Acho que falta ordem e progresso também! eu disse lá ‘ordem ou progresso’, mas hoje acho que falta ordem, falta progresso, falta mesmo… ê, país incrível!”, conclui Jair com um sorriso na fala. (Matéria publicada pelo jornalista Paulo Pacheco no Observatório da TV - UOL)